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Rankings, triste sinédoque da escola


não há educação inclusiva nem flexibilidade e autonomia curricular que resista à tirania dos exames

Ainda se lembra do que é uma sinédoque? Talvez não. Já imaginou quão culto seria se se lembrasse de tudo o que já soube um dia?

Se já não se lembra, vou recordar-lhe esse belo recurso expressivo que, sem saber, usa frequentemente no seu dia a dia, por exemplo quando afirma “O filho deve ouvir os conselhos do pai” ou “Há muitos portugueses sem teto”, em vez de “Os filhos devem ouvir os conselhos dos pais” e “Há muitos portugueses sem casa”. No primeiro caso, usou o singular pelo plural; no segundo, uma parte da casa pelo seu todo. Também na literatura, há exemplos muito conhecidos, como estes dois d’ Os Lusíadas: “[…] Que da Ocidental praia Lusitana [isto é, de Portugal] / passaram ainda além da Taprobana” e “[…] Que eu canto o peito ilustre Lusitano [ou seja, os portugueses]”. Simples!

No entanto, por estes dias, a sinédoque da moda é outra: a dos rankings das escolas. Por momentos, ao ver tantas classificações e resultados, fico baralhado; de que prova competitiva entre as escolas estão a falar? Eureka, esta gente erudita está a recorrer a uma sinédoque para falar de uma coisa trivial! Falam de exames como quem escreve Os Lusíadas da atualidade! Nada tenho contra a elevação da linguagem, bem pelo contrário. No entanto, espanta-me que os apreciadores de tão bela sinédoque a deturpem ao tentar explicá-la. Na verdade, é vê-los a revelarem a sua ignorância ao contradizerem a essência da própria natureza da sinédoque: o uso da parte pelo todo ou o todo pela parte. No caso em concreto, é óbvio que os rankings das escolas se referem ao todo (as escolas) por uma pequeníssima parte da sua realidade (os exames). Não se tirem, por isso, conclusões sem sentido. Não se olhe para os exames como um espelho das escolas, pois não representarão mais de 5% das suas muitas atividades, embora se pretenda fazer deles o mar para onde correm todos os rios. Nada disso, eles são afluentes de outros afluentes que vão dar ao grande mar das escolas: a preparação, em múltiplas dimensões, para a vida de todas as crianças e jovens. Eles não são a razão das escolas; no essencial (os do secundário são os mais importantes), são uma forma de seriação dos alunos que pretendem candidatar-se aos cursos superiores. São uma forma de poupar trabalho às universidades na admissão dos alunos com perfil para cada curso, ou seja, são uma forma de desresponsabilizar as universidades de uma responsabilidade que deveria ser exclusivamente sua.

Para terminar, um alerta: não há educação inclusiva nem flexibilidade e autonomia curricular que resista à tirania dos exames!

Medicamento contra a examinite, precisa-se, com urgência!

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