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Privados devem respeitar contratos que outorgaram

Não há professores de primeira e de segunda, pelo que condições de trabalho, incluindo horários, deverão ser semelhantes no público e no privado (ver documento em pdf).

A propósito dos contratos de associação e outros financiamentos públicos a operadores privados do setor da Educação, têm-se ouvido as mais diversas aleivosias. Na verdade, o que parece estar a mobilizar esses operadores e a sua associação representativa não é o emprego dos professores ou qualquer outra preocupação que não seja temerem que o maná que lhes tem caído do Estado deixe de ter a abundância a que se habituaram.

Na verdade, o que refere o Despacho Normativo n.º 1-H/2016, de 14 de abril, que mereça tanta contestação como a que se tem ouvido? Refere, na alteração ao artigo 25.º, n.º 3, que “Compete à Inspeção-Geral da Educação e Ciência, em articulação com a DGEstE, proceder à verificação do cumprimento, pelos estabelecimentos do ensino particular e cooperativo com contrato de associação, da respetiva área geográfica de implantação da oferta abrangida pelo contrato outorgado.”

E fica a dúvida: será que os operadores privados da Educação pretendem que não se proceda à verificação do cumprimento dos termos do contrato que outorgaram? Mas então por que assinaram um contrato que na sua cláusula 2.ª, ponto 1. d), refere ser obrigação do primeiro outorgante, o Estado, “Solicitar a intervenção da Inspeção-Geral da Educação e Ciência ou de outros serviços e órgãos de controlo, para que, no uso das atribuições e competências que lhe são legalmente cometidas, proceda à fiscalização do cumprimento dos termos do presente contrato, sempre que tal se afigure necessário” e na cláusula 3.ª , ponto 1. g), estabelece como obrigação do segundo outorgante, o estabelecimento privado, “Colaborar com a Inspeção-Geral da Educação e Ciência e com outros serviços e órgãos de controlo com competência para a fiscalização do cumprimento dos termos do presente contrato”?

Da agitação dos operadores privados acerca deste assunto fica a ideia, para além dos evidentes interesses materiais ligados ao financiamento público da sua atividade, de que a possibilidade de fiscalização lhes provoca uma grave intranquilidade. Mas não será normal o Estado garantir meios de fiscalização das parcerias público-privadas que estabelece? Ou só o deverá fazer em alguns casos?

Procurando transformar os seus trabalhadores em “guarda pretoriana”, os operadores privados têm centrado o discurso, não na verdadeira razão do seu protesto (a quebra de lucros imensos cuja origem, em alguns casos, está ainda em análise pelo Ministério Público), mas no desemprego de professores que poderá resultar da perda de alunos financiados pelo Estado. É a hipocrisia em todo o seu esplendor!

Onde estavam esses operadores privados quando o sistema educativo português, na sua globalidade, remeteu milhares de professores para o desemprego, levando a que a taxa de desemprego docente tivesse registado um aumento de 250%? Que preocupação tiveram com o emprego dos professores quando, em recente convenção coletiva adotada no setor, aumentaram o horário letivo dos professores em 20%, levando ao despedimento de percentagem semelhante de docentes? Que legitimidade têm então os operadores privados de Educação para, agora que lhes serve, alegarem preocupação com os professores que, em muitos dos seus colégios, para além de serem alvo de discriminação no horário de trabalho, em relação aos docentes do público, são igualmente discriminados em outros aspetos relacionados com condições de trabalho e de exercício profissional?

A FENPROF tem sido a organização que, com coerência, tem manifestado grande preocupação com o emprego dos professores do ensino particular e cooperativo e agido em conformidade. Fê-lo, recentemente, em dois momentos importantes: i) quando rejeitou assinar o contrato coletivo de trabalho que aumentou o horário letivo dos professores dos colégios privados; ii) na reunião realizada em 3 de maio no ME, ao propor que a organização do trabalho docente, incluindo os horários, no ensino privado financiado por dinheiros públicos se paute pelas mesmas normas do ensino público.

Não podem os operadores privados querer o melhor de dois mundos: por um lado, o dinheiro público, por outro a organização mais conveniente aos seus interesses financeiros e às suas margens de lucro. Se no ensino privado estas normas forem semelhantes às do ensino público, para além do reforço das condições de exercício da profissão docente, resultará um natural aumento do emprego. A FENPROF, na sequência da proposta que apresentou, solicitou ao seu gabinete jurídico o reforço da fundamentação jurídica nesse sentido.

Estas são razões suficientemente fortes que estão a levar a FENPROF, através dos seus Sindicatos, a promover reuniões com os professores do Ensino Particular e Cooperativo, que, aliás, é o setor em que a sindicalização tem conhecido maior crescimento. Esta será mesmo a oportunidade de os professores do Ensino Particular e Cooperativo perderem o medo, protestarem pela situação que vivem e exigirem das suas entidades patronais o respeito pelas mais elementares normas de exercício da profissão docente. Nesta matéria, a FENPROF não tem dúvida: não há professores do público e do privado, professores de primeira e de segunda. Há Professores e a todos são devidos os mesmos direitos!

O Secretariado Nacional da FENPROF
4/05/2016 

Mais sobre o tema:

Deve o Estado financiar as escolas particulares? (por Santana Castilho – Público 4.5.2016)

2 associações de ideias sobre contratos de associação (Tiago Antunes – 2.5.2016)

Número de colégios privados aumentou 10% e as escolas públicas caíram 50% (relatório CNE outubro 2015)

A Assembleia Municipal das Caldas da Rainha e o seu conceito de liberdade de escolha

Disputa pelos alunos entre público e privado já começou no Norte (DN 3.5.2016)

Suecos decepcionados com o seu sistema de educação (nenhum outro país europeu confiou uma fatia tão grande da educação dos seus filhos a empresas privadas como a Suécia)

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